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segunda-feira, 14 de setembro de 1998

O TROVÃO







CINFÃES

O TROVÃO

 


Empoleirado num ramo de árvore, arriscando, quebrei o galho, puxei o miúdo da minha idade… tombei em cima dele, coitado! – Ele a chorar, e eu a esfregar o fundo das costas que ardia como se fora queimado.
De volta a casa, o corpo dorido, ouvi na rádio um tal Raul Solnado com um falar engraçado todo cheio de graça …

Vim à janela ver o movimento da rua…
Sentia a poesia nas lamentações das folhas caídas, a aragem vinda do rio fustigando os troncos das árvores, um barulho ruidoso de um veículo motorizado ultrapassando um camião Ford pesado, uma pessoa ali outra acolá passando, duas outras conversando num banco de jardim…. e um cão vadio abandonado com o rabo entre as pernas desconfiado…

De repente, nuvens negras mais escuras que o carvão, se abateram por entre as casas dos povoados como um milhão de pneus queimados, escurecendo o ar…

Um raio rasgou o céu iluminando a vila como uma lâmpada automática e rebentou estremecendo os corações de tudo que vivia, sem saber o local onde caíra e a forma exacta.
Uma chuva intensa soltou fumo no ar e caiu lavando o pó do tempo, a rua ficou num vazio imenso, e fiquei à janela `a espera de outro raio… ouvindo alguém gritar:

- Foge daí filho, que dá azar! Não vês, que está a trovejar!

Decepcionado por não enxergar aquele feixe de luz poderoso, ameaçando o mundo por ser tremendamente medonho, fui deitar-me, e em cima da cama contando os segundos entre os intervalos do trovejar, adormeci com o barulho dos relâmpagos, embalado no som que o vilão fazia por entre descargas eléctricas no espaço dos meus sonhos de criança…

Adormecia e sonhando vivia montado num dragão, conduzindo pelos céus as asas do meu animal como um avião, erguendo a mão com meu escudo armado, defendendo a Terra do Trovão… como herói duma banda desenhada.