VILA NOVA DE POIARES
“A VOZ”
Era
pequenino, morava ao pé da estrada e um dia comecei a caminhar… seguindo a chama duma voz...
“Uma voz de
mel docente, mel de palavras sobre-humanas no templo do meu ouvidor-mor,
complemento de partículas flamejantes numa forma ancestral incolor, asas
bonitas mais brancas que o brilho de águas cristalinas, uma mensagem de luz na
minha companhia.”
Não existiam
temores, confiava no som daquele falar, conhecido por mim na vida de outras
vidas.
Para onde
iria não importava, meus pés pisavam o ar e as nuvens – quinas por onde seguiam
meus passos, seguros protegidos, eu ia fascinado pela luz da voz na estrada,
saltitando de árvore em árvore, ora de mão dada pelos sentidos invisíveis de
alguém que sussurrava em pouca ventania, e me guiava com ternura, e eu sentia o
mundo dentro de mim e não tinha medo de nada…
Eu caminhava
longe do sítio onde morava, queria seguir o caminho daquela estrada, estrada
fora no tempo… ir com aquele ser de asas branquérrimas, onde tudo era branco em
ponto miudinho e a cor do mundo transparente que não quer ser visto por
enquanto.
Nisto, senti
o soluçar de alguém cansado, abraçado a mim chorando:
- Onde vais
filho, que venho aflita?
Para que lugar,
em que direcção passas?
Sai tu, vem…
porque não paras?
Sou tua mãe
querida, volta para casa… e nunca mais
sozinho, vais por essa estrada!
Ao colo de
minha mãe, para trás olhava, disse adeus àquela luz, acenei… disse um dia que
noutro dia voltava.
Não
estava só.
Sentia que
lá no alto daquelas nuvens, havia outras transições, outros cruzamentos e que
alguém me amava vindo daquelas esquinas, lugarejo ignoto de existências
passadas…
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